Neto de Dener tenta ser jogador e manter legado do craque, morto há 29 anos
Rafinha é o 4º membro da família de Dener a tentar a carreira no futebol; carro raro que vitimou o ex-atacante está guardado no interior de São Paulo à espera de reforma.
A semelhança física e das habilidosas pernas que tratam a bola com carinho são as credenciais de um garoto de 12 anos que tenta manter o legado do seu avô, um atacante que encantou o Brasil no início da década de 1990 defendendo Portuguesa, Grêmio, Vasco e seleção brasileira.
Vestindo a camisa da Portuguesa que um dia transformou Dener no “Reizinho” do Canindé, Rafael Cavalcante sonha em escrever um novo capítulo na história da família que sofreu com a precoce morte de um dos mais promissores atacantes do futebol brasileiro.
“Meu avô me inspira muito, até mesmo nos vídeos, minha família que sempre apoiou ele continua me ajudando e espero continuar o legado dele. Eu acho que vou conseguir lutando e treinando, se Deus quiser um dia vou conseguir”, disse Rafinha, em entrevista exclusiva ao GE.
Rafael nasceu 16 anos após a morte do avô. Dener foi vítima de um acidente automobilístico em 1994, quando defendia o Vasco e acabou batendo o carro na Lagoa Rodrigo de Freitas, quando voltava para São Paulo onde passaria o fim de semana de folga.
“A maior memória que tenho são os vídeos e os relatos que meus avós e meus tios contam. Ele representou uma nova era do drible, inspirou grandes jogadores e acho que as pessoas conhecem meu avô, o povo o conhece, meus amigos comentam comigo que assistem a vídeos dele”, conta Rafinha, que guarda um quadro e algumas camisas usadas pelo avô.
Dener deixou três filhos: Denis, Felipe e Matheus. Os três tentaram jogar futebol, mas nenhum se profissionalizou. Rafinha é filho de Felipe e agora 4º quarto membro da família que busca de alguma formar manter o legado do ex-craque.
“Meu pai e meus tios não conseguiram, mas estou aqui para continuar o legado. Meu pai até que era bom, mas meus outros tios eram grossos. Eu jogo melhor que os três. Eu acho que ao mesmo tempo que atrapalha é uma coisa boa. É como um refletor, que todas as pessoas veem”, frisou Rafinha.
Rafinha nunca participou de alguma das tradicionais peneiras que são a principal porta de entrada para os clubes grandes. O avô materno do garoto, Chicão Cavalcante, tem uma estratégia diferente para tentar livrar o neto do assédio de empresários.
Prestes a completar 13 anos, Rafinha treina no Centro da Coroa, tradicional time amador da Zona Norte de São Paulo, que revelou Elias (ex-Corinthians); Pedro Geromel (Grêmio), e também foi um dos formadores de jogadores como Endrick, do Palmeiras, e Gabriel Martinelli, do inglês Arsenal.
A ideia é ficar no clube se desenvolvendo até reunir condições de acertar com algum grande clube em definitivo.
O neto de Dener começou a curta carreira no futsal da Portuguesa, onde ficou 2 anos até a pandemia obrigar o clube a encerrar as categorias de base. Desde então, Rafinha tem jogado algumas competições pontualmente, como foi no Nacional no ano passado e agora no EC São Bernardo, onde jogou o Campeonato Paulista Sub-13.
“A Portuguesa representa muita coisa para mim, meu avô jogou lá, eu joguei lá e foi o clube que revelou meu avô e proporcionou que ele pudesse jogar futebol. Muitas pessoas me pediam foto lá, todo mundo falava comigo. Não fiquei lá porque as categorias de base encerraram após a pandemia”, disse Rafinha.
“Espero ser reconhecido por ser o Rafinha, estou treinando para jogar na Europa e ser reconhecido”, falou Rafinha.
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E a manutenção do legado de Dener passa por uma mudança no estilo de jogador do avô para o neto. Rafinha avalia a sua forma de jogar com uma característica principal: a posse de bola. O jovem de 12 anos trocou o drible e a velocidade do avô pelo controle da bola e o passe.
“ Nossa semelhança é mais física, meu avô era mais driblador, veloz, arriscava na última linha e eu já sou mais um jogador que distribui a bola, gosto de troca de passes”, esclareceu Rafinha.
Rafinha é meia-atacante, mas também atua como volante e lateral-direito. O jogador em formação entende que o futebol moderno exige a multifuncionalidade dentro de campo. Por isso, não descarta ter que atuar em uma função diferente da que consagrou Dener.
Quem foi Dener
Nascido em 02/abril/1971, Dener Augusto de Sousa foi um atacante revelado para o futebol na Portuguesa, onde ganhou destaque sendo campeão e eleito o craque da Copa São Paulo de Futebol Júnior em 1991.
Não demorou muito para o atacante ser apontado como uma das principais revelações do futebol brasileiro. Com um estilo de jogo apoiado na velocidade e no drible, Dener foi promovido ao time profissional da Portuguesa, onde também se destacou até ser emprestado ao Grêmio em 1993.
O atacante foi campeão gaúcho pelo Grêmio e retornou para a Portuguesa no mesmo ano. Em 1994, Dener foi emprestado para o Vasco. Ele foi campeão carioca antes de morrer em um acidente de trânsito na Lagoa Rodrigo de Freitas, no dia 19/abril daquele ano.
Dener também disputou dois jogos pela seleção brasileira. O atacante foi convocado por Paulo Roberto Falcão para a disputa de dois amistosos em 1991, contra Argentina e México, respectivamente. O jogador, na época com 20 anos, atuou por alguns minutos das duas partidas que tiveram como titulares nomes como Bebeto, Careca e Renato Gaúcho.
Processos finalizados
A família de Dener não possui mais nenhum tipo de processo indenizatório em curso. O Vasco, clube que mantinha contrato com o ex-jogador na época, demorou quase uma década para pagar o valor acordado após o fim do imbróglio entre as partes na Justiça.
Em 2015, o Vasco quitou uma indenização de cerca de R$ 5 milhões à viúva e aos três filhos. Inicialmente, a dívida era para ter sido paga no fim de 2010, mas o clube atrasou o pagamento e teve de fazer novo acordo para encerrar o processo.
O imbróglio jurídico era dividido em duas histórias e tinha o mesmo motivo: o Vasco, quando contratou o jogador em 1994, não fez seguro de vida para Dener – apenas por acidente de trabalho.
À época, Eurico Miranda, então vice de futebol, disse que o jogador não queria fazer seguro em nome da Portuguesa e alegou que não poderia fazer de pessoa física para pessoa jurídica – o Grêmio, porém, havia feito isso no empréstimo anterior.
A morte de Dener representou também um gasto de quase R$ 10 milhões para os cofres vascaínos. O clube pagou cerca de US$ 20 mil para a mãe quitar um dos apartamentos que o filho tinha comprado. Dener era o mais alto investimento da equipe para o tricampeonato carioca de 1994. O clube pagou para a Portuguesa US$ 350 mil, mais o empréstimo do zagueiro Tinho.
Em longas batalhas judiciais, a Portuguesa recebeu R$ 4,6 milhões em 1999. Para a viúva, que pedia indenização original de R$ 15 milhões, o acordo saiu por R$ 5 milhões somente em 2007, mas foi pago totalmente apenas em 2015.
Família sonha com reforma de carro
O grande sonho da viúva e dos três filhos de Dener é a reforma do Mitsubishi Eclipse branca, placa DNR 0010 – em alusão ao número da camisa e as iniciais do ex-jogador. O veículo, que ficou guardado por 25 anos em uma garagem por um ex-dirigente do Vasco, é o mesmo que vitimou Dener em 1994.
O carro de Dener foi um presente da Portuguesa por uma renovação de contrato. O jogador exigiu o veículo para assinar com a Lusa e voltar a treinar em 1993. A Mitsubishi Eclipse, carro raro na época no Brasil, permaneceu no Rio para perícia, por decisão judicial. E nem o Vasco nem a Portuguesa, muito menos a família de Dener quiseram levar o carro.
A família chegou a firmar um acordo para a reforma do carro com uma empresa especializada na restauração de veículos antigos. No entanto, o projeto não foi adiante. O veículo, agora sob posse dos familiares de Dener, está guardado em uma garagem no interior de São Paulo onde aguarda um interessado. A ideia da família é promover eventos com o carro e depois leiloá-lo.
Atualmente, o preço de mercado do carro, em boas condições, pode chegar até os R$ 60 mil. Por ter sido de Dener, o veículo avariado tem certa valorização.
(Fonte: GE)