Nas entrelinhas do dia a dia

Por: (*) João Ulysses Laudissi – 22/setembro/2025
“A democracia tem que nascer de novo a cada geração, e a educação é sua parteira. ” (John Dewey)
John Dewey (1859–1952) foi filósofo, psicólogo e pedagogo norte-americano, considerado um dos maiores representantes do pragmatismo e o principal nome da educação progressista nos Estados Unidos. Para ele, as ideias só têm valor quando colocadas em prática e quando produzem efeitos concretos na vida das pessoas. O conhecimento não é algo fixo, mas um processo contínuo de investigação e adaptação.
Em 1916, Dewey publicou sua obra mais famosa, Democracy and Education (Democracia e Educação), na qual afirma que a democracia precisa nascer de novo a cada geração e que a educação é o meio para tornar isso possível.
Suas ideias marcaram diferentes áreas. Ele defendia que:
– a educação deve ser uma experiência de participação ativa, não apenas a transmissão de conteúdos;
– a democracia é um modo de vida, e não apenas um sistema político;
– o conhecimento é prático e deve ser validado pelas consequências que gera;
– a escola precisa formar cidadãos críticos e colaborativos.
Dewey nos lembra que a democracia exige vigilância constante. Para ele, a verdadeira educação do cidadão consiste em interpretar criticamente o que acontece ao seu redor, não se contentar com a primeira impressão, mas buscar o que está implícito — aquilo que se revela nas entrelinhas da realidade.
Quando uma sociedade perde essa capacidade, abre espaço para a manipulação e a passividade. Narrativas prontas substituem a reflexão, o espetáculo toma o lugar da análise, e a pressa pelo imediato enfraquece a profundidade do pensamento. Dewey advertia que a democracia pode morrer não apenas pela tirania explícita, mas também pela indiferença silenciosa, quando os cidadãos deixam de perceber os sinais da erosão do tecido social.
E o que isso significa para o Brasil de hoje?
Em grande medida, deixamos de lado essa lição de casa. Muitas vezes preferimos a pressa da manchete ao contexto, a emoção imediata à reflexão paciente, o espetáculo ao detalhe. Quando não lemos nas entrelinhas, aceitamos narrativas prontas, repetimos o que ouvimos e nos acomodamos no conforto do imediato. Com isso, permitimos que ruídos se confundam com verdades, que atalhos se tornem rotina e que a superficialidade se estabeleça como norma.
Ignorar as entrelinhas é abrir mão do pensamento crítico. Quando isso acontece, a democracia perde consistência, a cultura se empobrece e a cidadania se enfraquece. A tarefa que o Brasil deixou de cumprir não é apenas política ou econômica: é também filosófica. Esquecemos que o essencial não grita, mas sussurra — e cabe a nós afinar o olhar e o ouvido para captar o que realmente importa.
(*) – Engenheiro, especialista em qualidade e professor, dedica-se a análises, gestão e educação.