Líder em verba pública da Secom, JN garante ampla rejeição a Lula
Pesquisas realizadas por diferentes institutos e divulgadas nos últimos dias mostram que a confiança do eleitorado declinou, ao longo dos últimos meses, justamente quando a publicidade estatal investiu, maciçamente, na mídia conservadora.
Quanto mais o governo federal investe em publicidade na mídia corporativa, maior é o índice de rejeição junto ao eleitorado. A dinâmica, que se assemelha à política de Comunicação Social levada adiante no governo da presidenta deposta Dilma Rousseff (PT), repete-se no 3º mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para especialistas no setor, falta uma condução mais assertiva da Secom (Secretaria de Comunicação Social) da Presidência da República para levar a mensagem de Lula à maioria dos eleitores brasileiros.
Pesquisas realizadas por diferentes institutos e divulgadas nos últimos dias mostram que a confiança do eleitorado declinou, ao longo dos últimos meses, justamente quando a publicidade estatal investiu, maciçamente, na mídia conservadora. O setor, altamente cartelizado, caracteriza-se pelo apoio às forças de direita e ultradireita, adversárias do presidente ao longo dos dois mandatos anteriores e, de maneira mais aguda, na derrocada da administração petista liderada por Dilma Rousseff. Em uma série de artigos e reportagens, o Correio do Brasil tem mostrado a falha, ao longo das últimas duas décadas.
Líder nacional entre os jornais televisivos e principal porta-voz do conservadorismo, o Jornal Nacional foi o programa de TV que mais recebeu verba pública do governo Lula, no primeiro ano da atual gestão. Os anúncios direcionados ao principal telejornal da TV Globo, que ao longo das últimas décadas impulsiona o crescimento da ultradireita fascista, no país, somam ao menos R$ 24 milhões.
‘Fantástico’
O programa chegou a ser o 3º colocado no mesmo ranking durante a gestão Jair Bolsonaro (PL), quando a maior parcela da verba de anúncios foi direcionada ao Jornal da Record.
Em 2º lugar, ainda para as Organizações Globo, o programa que mais recebeu inserções publicitárias do governo foi o ‘Fantástico’, com a veiculação de comerciais que, somadas, chegam a R$ 11,7 milhões. Os números referem-se às veiculações no canal nacional e nas emissoras regionais do grupo.
O Jornal Nacional, no entanto, foi apenas o segundo programa mais visto da Globo, com 22,8 pontos, atrás apenas da novela Renascer (25,2 pontos).
O site registra que os dados são da Kantar Ibope obtidos com fontes do mercado. Cada ponto equivale a pouco mais de 73 mil domicílios.
O repasse contínuo ao Grupo Globo ocorre mesmo depois que o presidente Lula observou a atuação politizada e tendenciosa do grupo de emissoras que integra o patrimônio da família Marinho.
“Foram horas e horas no Jornal Nacional e em todos os noticiários da Globo tentando dizer que a corrupção na Petrobras e no país teria sido inventada por nós”, escreveu Lula em carta quando estava preso, em 2018.
Volume
O governo Lula ainda veiculou propagandas de R$ 10,6 milhões no ‘Jornal da Record’ — emissora líder no segmento evangélico e de ultradireita — que liderava o apoio ao governo de Jair Bolsonaro (PL). Atualmente, é o 3º colocado entre os programas que mais receberam verba do governo.
Os dados, que constam do portal da Secom, mostram inserções publicitárias já autorizadas e realizadas em campanhas da própria pasta e de ministérios, mas não revela o volume da verba de bancos públicos e estatais, como a Petrobras, que atinge cifras também milionárias.
Outros veículos de TV, rádio e internet do Grupo Globo receberam, no ano passado anúncios de ao menos R$ 118 milhões. O valor representa cerca de um terço dos R$ 358 milhões em publicidade detalhados no portal da Secom, segundo apurou o diário conservador Folha de S. Paulo que, por sua vez, também recebe cifras milionárias do governo.
Redes sociais
Outra parte relevante da verba pública manipulada pela Secom vai para fora do país. As plataformas de redes sociais norte-americanas estão entre empresas que mais receberam verba do governo.
A Meta, empresa que controla Facebook, Instagram e WhatsApp, foi o destino de ao menos R$ 13,3 milhões em anúncios em 2023, sem considerar o volume aplicado pelas empresas estatais.
No mesmo segmento, o TikTok recebeu R$ 5,5 milhões, seguido por Google (R$ 4,3 milhões) e X, antigo Twitter (R$ 3,7 milhões). “Assim como no caso das TVs, não é possível apontar o total recebido por essas empresas em publicidade federal, pois os dados divulgados são parciais e não consideram campanhas de bancos e estatais”, ressalva a FSP.
Os dados da Secom revelam, ainda, que o governo voltou a investir em veículos que não haviam sido incluídos nos planos de mídia de 2020 a 2022, durante o governo Bolsonaro, como a própria FSP, que recebeu R$ 648,9 mil em 2023, conforme o painel da secretaria, e os jornais O Globo (R$ 859,4 mil), de novo do Grupo Globo, e O Estado de S. Paulo (R$ 593,1 mil).
País dividido
“Mais do que um problema na área da comunicação, o governo padece da falta de uma estratégia para enfrentar a profunda crise nacional e a nova conformação política com a intensa polarização com a ascensão da extrema-direita”, avalia Igor Felippe Santos, jornalista e analista político com atuação nos movimentos populares, em recente artigo publicado pela revista CartaCapital.
Santos observa que “a pesquisa Genial/Quaest aponta uma queda persistente da aprovação do trabalho do Lula e do governo federal, em comparação com os levantamentos anteriores do mesmo instituto. O sinal amarelo acendeu, mas ainda não houve uma mudança qualitativa. O quadro repete o padrão das pesquisas realizadas durante as eleições de 2022, especialmente entre os dois turnos”.
“O país continua dividido entre o campo esquerda, que construiu uma frente ampla no processo de resistência ao governo Bolsonaro, e a extrema-direita, que sustenta sua hegemonia na direita com capacidade de mobilização e intensa luta ideológica. Os números da pesquisa expressam, a grosso modo, a polarização entre aqueles que aprovam e desaprovam o trabalho do presidente Lula (51×46), com impactos no deslocamento do segmento que não se alinha automaticamente na disputa”.
Adversário
Igor Santos constata, ainda, que “a esquerda tem maioria ampla na região Nordeste (68×31), enquanto a direita tem mais força no Sudeste (52×44) e no Sul (57×40). A esquerda tem vantagem entre aqueles que têm escolaridade até o ensino fundamental (59×38), enquanto a direita é superior entre os que têm ensino superior (53×45)”.
“Os indicadores da avaliação do governo pioraram nos últimos 12 meses. Eventualmente, podem até melhorar por questões conjunturais no próximo período. É natural que determinados segmentos – cada vez mais estreitos – se desloquem entre os dois polos. A questão é que a moldura da fotografia do momento segue um padrão, com dois polos que dividem a sociedade e tem mais ou menos apoio em certos indicadores”.
Diante disso, segundo o analista, “cabe ao governo atuar sobre a situação concreta e fazer a disputa na sociedade, apresentando um projeto de Nação e conduzindo uma agenda pública. Ao mesmo tempo, implementar políticas capazes de melhorar efetivamente a vida da população. Assim, poderá fortalecer a adesão dos seus apoiadores, atrair o segmento flutuante e incidir na base do adversário”.
Problema
“Até agora a Esplanada dos Ministérios optou por gerenciar a burocracia, retomar políticas públicas exitosas 20 anos atrás e negociar com adversários sem demarcar a diferença de projeto. Lula é o único que participa do debate público geral e se posiciona diante de questões relevantes. O ministro Fernando Haddad tem aberto discussões na sua área, assim como fazia o então ministro Flávio Dino. Para além disso, é um silêncio constrangedor”, observa.
Com o apoio da mídia conservadora, “o quadro de polarização está consolidado e a extrema-direita intensifica a disputa. Mesmo com o cerco a Jair Bolsonaro, tenta manter iniciativa política. Do seu lado, o governo tem uma política ‘água com açúcar’, amarrado pela frente ampla, que neutraliza os esforços da esquerda de fazer os enfrentamentos”.
“Desse modo, jogar toda a responsabilidade pela queda da aprovação da gestão na comunicação simplifica o problema, embora essa área tenha limites evidentes”, ressalva o comunicador. O buraco é mais embaixo, porque a política de comunicação é um desdobramento da política do governo”, conclui.
(Fonte: Correio do Brasil/BR.MSN)