O labo B do futebol feminino: conheça a Realidade Jovem, time fundado por mãe para realizar sonho de filhas serem jogadoras

    O futebol feminino vem em franco crescimento nos últimos anos e tem chamado mais a atenção do público brasileiro. Em meio aos grandes times do País como Corinthians, Ferroviária e Palmeiras, também tem espaço para clubes que enfrentam um cenário ainda mais desafiador. Um destes exemplos é a Realidade Jovem, de São José do Rio Preto, no interior paulista.

     Fundado há 27 anos, em 1996, por Doroteia Inojo, que é presidente até hoje, a equipe continua resistente e na luta pelos seus direitos das mulheres na sociedade, além de nutrir o sonho de evoluir por um futebol melhor.

     Neste ano pelo futebol Paulista Feminino foi possível observar uma observação do time que enfileirou goleadas nos anos anteriores. Apesar da eliminação na 1ª fase nesta edição de 2023, a Realidade Jovem teve a melhor participação de sua história.

      Contando a partir do novo formato da competição, em 2021, a equipe teve 18,1% de aproveitamento. No ano seguinte, teve apenas 2% de aproveitamento, não tendo vencido nenhuma partida.

     Em 2023, ficou com 21,1%, com dois triunfos, sendo um por WO contra o Pinda, e o outro contra o EC São Bernardo por 3 a 2. Esta última vitória, aliás, foi a primeira depois de dois anos.

      A equipe encerrou sua participação na competição após a derrota por 2 a 0 para o São Paulo, na quinta-feira (14/setembro).

     Em 2020, quando o Paulistão feminino ainda era dividido em dois grupos com cinco jogos na 1ª fase, a Realidade Jovem teve um aproveitamento de 2%.

Criado para realizar o sonho das filhas

      O clube nasceu, na verdade, pelo desejo das filhas de Doroteia em jogar futebol. No passado, a realidade das mulheres que gostavam de praticar o esporte era ainda difícil.

      Então, para realizar o desejo das duas filhas mais velhas, Milene e a Sharlene, que jogavam futebol na escola, Doroteia pensou na hipótese de criar um time ainda na brincadeira, mas que, no final, deu mais que certo.

      “Nós começamos em família, em 1996. Minhas três filhas estudavam na escola e aqui em Rio Preto existia o Rio Pretildes, que era de escola com escola, era uma coisa muito competitiva e elas começaram a jogar futebol pela escola, a mais velha e a do meio. A Milena e a Sharlene. E aí tudo começou em uma brincadeira, vamos montar um time, e hoje eu estou onde eu estou”, contou a presidente.

      E o ‘empurrãozinho’ dos pais para que as filhas continuassem jogando futebol funcionou. Entretanto, foi a caçula que entrou para este mundo: Darlene Reguera, a mais nova, atualmente é atacante do Flamengo e já até atuou no exterior, no Benfica, de Portugal, no Prainsa Zaragoza, da Espanha, e no Changchun Dazhong, da China.

Parceria com Rio Preto e Ponte Preta

     A Realidade Jovem foi parceira do Rio Preto, onde conquistou um título brasileiro (2016) e dois estaduais (2016 e 2017) e também da Ponte Preta, em 2019. Foi a partir de 2020 que o time passou a jogar com o nome próprio.

     Doroteia explicou ao ge como funcionou estes acordos entre os clubes. “Minha parceria com a Rio Preto sempre foi usando o nome do Rio Preto. Eu usava a camisa deles mas o nome sempre foi meu, sempre foi tudo da Realidade Jovem a vida inteira, apenas fizemos uma parceria que em 2018 eu resolvi por fim. Assim que eu rompi minha parceria com Rio Preto, a Ponte Preta me procurou para que eu jogasse 2019 com a camisa deles.

 Então joguei com a camisa da Ponte, mas não mais com o time que eu tinha na época do Rio Preto, porque eu dispensei todas as atletas, liberei todo mundo para cada um procurar seu clube. Nós tínhamos um time potente então a gente representou a Ponte nessa ocasião, mas também não quis continuar a parceria em 2020 e saí por conta própria com toda a documentação necessária na Federação Paulista de Futebol e aí, usando o nome da Realidade Jovem”, contou.

Luta contra as dificuldades

      E ainda há luta. Seja para resolver os problemas financeiros do clube, como para tentar diminuir os preconceitos ainda existentes por serem mulheres praticando um esporte historicamente masculino.

     “De 96 para cá mudou muita coisa. Hoje o apoio dos patrocinadores são bem maiores financeiramente. Quando eu disputei e fui vice-campeã brasileiro em 2018, fui campeã brasileira em 2016, nós não tínhamos a premiação que tem hoje. Então mudou bastante coisa nesse sentido aí”, frisou.

     A pandemia também foi um momento complicado para Doroteia, que teve que ‘fechar as portas’.

      “Na pandemia o trabalho foi encerrado, não permitiram que a gente mantivesse esse alojamento. Nós fechamos o alojamento e cada atleta foi para sua casa. Quando a Federação retornou o Paulista só no final do ano, foram muito poucas equipes. Mantivemos apenas atletas aqui de Rio Preto e da região. 2020 eu comecei caminhar com meus próprios pés, um período muito difícil, porque eu comecei do zero, liberei todas as atletas para procurar cada uma o seu clube e aí eu comecei do zero usando jogadoras de base!, contou.

     Dentre todas, a maior dificuldade citada pela presidente é, realmente, a financeira. “A maior parte das equipe hoje enfrenta a dificuldade financeira. A minha principalmente é a financeira. A prefeitura paga parte do salário das atletas. Temos uma cota na prefeitura onde uma parte das atletas recebem um valor e os demais a gente tenta buscar parceria. A dificuldade continua sendo os valores, altos salários de atleta e financeiro. Tudo é financeiro”, disse.

     Mesmo depois de muitos anos e com a (pequena) diminuição dos ataques feitos à mulheres que praticam esportes, o preconceito, infelizmente, ainda é visto nos dias de hoje.

     “Sempre foi muito tranquilo para mim comandar, porque era um time de mulheres. O preconceito com certeza ainda hoje é visto e tem muito. Se você for ver os comentários na internet é bem complicado, pessoal tem bastante preconceito ainda, mas não tanto como a gente começou. De machismo, preconceito, sim, muitos. Se tem menina passando é olha lá as menina que jogam futebol. Muitos falava palavrões. Já tivemos muitos episódios desse sentido aí, já briguei muito, falavam coisas erradas de atleta, que são tudo ‘sapatão’ e aí eu acabava brigando. Mas pensei, vou parar de brigar porque não vai resolver, esse preconceito nunca vai acabar”, desabafou.

Futuro do clube

     Agora, com o fim do Paulistão Feminino para a Realidade Jovem, é a hora de pensar no futuro. Já em outubro a equipe tem compromisso nos Jogos Abertos, que serão disputados em São José do Rio Preto.

     A principal novidade é que o time disputará uma competição a nível nacional no ano que vem, pela primeira vez com o nome Realidade Jovem.

      “Agora após o término do Paulista temos os jogos abertos que vão ser aqui em São José do Rio Preto que representamos a prefeitura. E após isso nós vamos disputar a Ladies Cup sub-20 que vai ser lá na região de Itapira, Águas de Lindóia. E aí depois eu consegui a vaga para o Brasileirão A3 do ano que vem. Então minha intenção é essa. É continuar mantendo a equipe para poder chegar lá com tranquilidade. A vaga do Brasileiro Série A3 do ano que vem é classificatória do Paulista, são duas vagas do estado de São Paulo e nós ficamos em 9º, e os times que estão para cima já tem vaga na A1 e A2, então somos os próximos e consegui a vaga”, afirmou Doroteia, que espera um time mais forte para os próximos compromissos.

(Fonte: G1 São José do Rio Preto e Araçatuba – Colaborou sob supervisão de Arcílio Neto).