Uma história de amor: Casal morre no mesmo dia depois de conviver 7 décadas juntos

        Um amor que atravessou o tempo, desafiou o ditado “até que a morte os separe” e, por fim, terminou como começou: lado a lado. O casal que morreu no mesmo dia, com 10 horas de diferença, após sete décadas de união ganhou uma homenagem da família que resolveu plantar dois ipês verdes, considerados raros, simbolizando cada um, em uma chácara em Votuporanga (SP).

        Odileta Pansani de Haro e Paschoal de Haro partiram no dia 17/abril, dois dias depois de completarem 74 anos de matrimônio. Os filhos, netos e bisnetos resolveram eternizar a história do casal com a plantação. O g1 acompanhou a cerimônia.

        À reportagem, a filha mais nova, Karina Leal, explicou que a conexão entre os dois era tão forte que o falecimento quase simultâneo não surpreendeu a família. Ao contrário, apenas reforçou o que todos já sabiam: o amor entre eles era inquebrável, “Tudo na nossa família era motivo de festa, motivo para nos reunirmos; eles amavam essas reuniões. Nada mais lindo do que os recordamos em uma cerimônia. Isso os trás mais próximos de todos nós, nos faz sentir a presença viva deles”, afirma Karina.

        O gesto de plantar as árvores foi carregado de emoção, memória e significado, uma vez que, conforme Karina, os pais amavam plantas e cuidavam de um jardim florido em casa, onde faleceram.

        A escolha do ipê verde se justifica por ser uma espécie rara e ter utilização farmacológica no tratamento de doenças. Em meio às lembranças, ela também relembra um gesto que se tornou marca registrada da relação dos pais: “Na minha memória vejo meu pai colocando água naquelas plantas e minha mãe conversando com suas rosas ou tirado um galinho para nos proteger quando íamos viajar. Foi um ato de amor e memória transformando nossa enorme perda em um renascimento” reflete a filha.

        Questionada o que diria para os pais se tivessem mais uma oportunidade, a filha completou: “Que eles nunca parem com as bitoquinhas de amor onde quer que estejam, que esse som do mais puro e belo de amor que ouvimos nossas vidas todas possam chegar até nós, sendo o bálsamo de alívio para nossa alma”, concluiu a filha.

‘Cartas para o céu’

       Setenta anos de casamento, uma história construída a dois e um final que parecia escrito pelas “mãos do destino”. Pouco depois da partida do casal, a família encontrou algo inesperado: cartas de amor trocadas entre os dois ao longo da vida.

        O achado, conforme a filha, trouxe conforto e alegria, reafirmando o quanto aquele amor era vivo e verdadeiro. Em meio a dor da despedida, os papéis amarelados pelas décadas se tornaram um alívio e a confirmação da história construída com palavras e afeto.

        Sabendo do gosto do casal pela escrita, em mais ritual, a família decidiu escrever cartas para o céu”. Cada filho e neto deixou ali, em palavras escritas à mão, mensagens de saudade, gratidão e amor eterno. As cartas foram deixadas em um baú.

“Para todos foi uma surpresa e uma alegria encontrarmos as várias cartas de amor que eles trocavam entre si. Tenho certeza que eles receberam os recadinhos cheios do nosso amor para com eles”, garante Karina.

História que começou na praça

        Após um encontro na Praça da Matriz, onde nasceria a paixão entre Odileta, aos 15 anos, e Paschoal, aos 18, que a troca das cartas de carinho começou. Entenda a história deles:

        As mensagens, enviadas ao g1 pelo genro do casal, Luciano Leal, revelam não apenas o afeto, mas também as angústias, os medos e a profunda admiração mútua que mantiveram até o fim. 

        Leia um trecho: No dia 03/dezembro/1947, Paschoal enviou a primeira carta e declarou amor eterno a Odileta: “Desejaria viver ao teu lado, adivinhar os teus desejos, fazer-te feliz porque só assim eu seria feliz também. Acredito que jamais pensarei em outra mulher. Mesmo que viva mil anos me lembrarei de ti e dos momentos felizes que passei ao teu lado. “No dia 04/fevereiro/1950, com a letra simples de uma adolescente apaixonada, Odileta chamou Paschoal de “meu brotinho dourado“, falou sobre a rotina com o, até então, namorado e completou: “Já estou pensando como devo fazer para aguentar ficar um mês longe de você“.

        Assim como viveram lado a lado com delicadeza, parceria e uma rotina de amor, também partiram juntos. Um amor verdadeiro que resistiu a tudo, inclusive ao tempo.

        O plano da família, conforme Luciano disse após encontrar as escrituras, é eternizar as mensagens em um livro. “Hoje, após a morte, eu não diria que as cartas ficaram como um consolo, muito mais como uma prova viva e um símbolo de que acreditemos sempre no amor, pois o amor sempre vence”, completa.

Primeira troca de olhares

        Odileta nasceu em Mirassol (SP), enquanto Paschoal era de Bálsamo (SP), cidades a cerca de 14 quilômetros de distância uma da outra. Mas a história de amor, que atravessou décadas, começou na Praça da Matriz, em Votuporanga (SP).

        Ainda conforme Luciano, o que eles não esperavam era que uma correntinha seria o cupido do relacionamento.

       À época, Paschoal se entretinha rodando a corrente, quando, por um descuido, ela se desprendeu e caiu no braço de Odileta. Com a troca de olhares e risadas, nasceu a paixão do casal. Desde então, conversas por cartas tornaram-se testemunhas do namoro.

        O casamento ocorreu na fazenda dos pais de Odileta, em Votuporanga, em 15/abril/1951, dia em que Paschoal completou 20 anos. Da união, nasceu um legado de seis filhos, netos e bisnetos. Depois da troca de alianças, Odileta cuidava da família e Paschoal trabalhava em uma loja de tecidos.

        A coincidência das datas não acaba por aqui. Além do aniversário de casamento, o dia 15/abril nunca mais foi o mesmo depois do nascimento da primeira neta, Camila, e da primeira bisneta, Athena, nesta mesma data.

(Fonte: G1 São José do Rio Preto e Araçatuba)